O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) esteve presente na sede da Polícia Federal em Brasília nesta quinta-feira (22), mas optou por permanecer em silêncio diante dos investigadores que estão apurando uma suposta tentativa de golpe de Estado.
A decisão de Bolsonaro de ficar em silêncio foi comunicada pelo advogado Fabio Wajngarten. Ele passou menos de meia hora no local.
Em entrevista, Wajngarten disse que o ex-presidente “nunca foi simpático a qualquer tipo de movimento golpista”.
“Esse silêncio [no depoimento] quero deixar claro que não é simplesmente o uso do exercício constitucional silêncio, mas uma estratégia baseada no fato de que a defesa não teve acesso a todos os elementos por quais está sendo imputada ao presidente a prática de certos delitos”, afirmou o advogado.
Wajngarten afirmou que a ausência de acesso à delação de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, e às mídias obtidas nos celulares apreendidos dos investigados “impede que a defesa tenha um conhecimento mínimo sobre os elementos que levaram à convocação do presidente para o depoimento”.
Outros investigados
Além do ex-presidente, outros investigados compareceram para prestar depoimento. Entre eles estão o ex-ministro e candidato a vice-presidente pelo PL nas eleições de 2022, Walter Souza Braga Netto; o presidente do PL, Valdemar Costa Neto; o ex-ministro substituto da Secretaria-Geral da Presidência, Mário Fernandes; o oficial do Exército Ronald Ferreira de Araújo Junior; e o ex-comandante da Marinha Almir Garnier.
Segundo as defesas, Ronald Junior e Mário Fernandes optaram por permanecer em silêncio.
Por uma estratégia da PF, todos os investigados foram convocados para depor simultaneamente, com o intuito de evitar possíveis combinações de versões.
Esses depoimentos fazem parte da operação Tempus Veritatis, deflagrada pela PF há duas semanas. Segundo as investigações, Bolsonaro e seus aliados teriam se organizado para promover um golpe de Estado e mantê-lo no poder, impedindo a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Parte da investigação inclui uma reunião ministerial realizada em 5 de julho de 2022. Na ocasião, Bolsonaro teria instruído os ministros a agir sem esperar pelo resultado das eleições. No entanto, os advogados do ex-presidente afirmam que ele nunca considerou a possibilidade de um golpe.
Também foram convocados para prestar depoimento:
- Augusto Heleno (general e ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional)
- Anderson Torres (ex-ministro da Justiça)
- Marcelo Costa Câmara (coronel do Exército)
- Tércio Arnaud (ex-assessor de Bolsonaro)
- Paulo Sérgio Nogueira (ex-ministro da Defesa)
- Cleverson Ney Magalhães (coronel do Exército)
- Bernardo Romão Correia Neto (coronel do Exército)
- Bernardo Ferreira de Araújo Júnior.
Outros depoimentos também foram marcados em outras cidades do país
- Rio de Janeiro: Hélio Ferreira Lima, Sérgio Ricardo Cavaliere de Medeiros, Ailton Gonçalves Moraes de Barros e Rafael Martins Oliveira;
- São Paulo: Amauri Feres Saad e José Eduardo de Oliveira;
- Paraná: Filipe Garcia Martins;
- Minas Gerais: Éder Balbino;
- Mato Grosso do Sul: Laércio Virgílio;
- Espírito Santo: Ângelo Martins Denicoli;
- Ceará: Estevam Theophilo (esse depoimento é o único marcado para sexta-feira).
Silêncio de Bolsonaro
A defesa do ex-presidente já havia informado que ele permaneceria em silêncio durante o depoimento. Nos últimos dias, os advogados solicitaram acesso aos autos da investigação em duas ocasiões.
O relator do caso, ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou o acesso aos mandados da operação.
Entretanto, os advogados do ex-presidente também requisitaram acesso às mídias digitais, como telefones, computadores, e à delação do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid, mas Moraes não concedeu autorização.
Diante disso, a defesa solicitou novamente acesso ao conteúdo das mídias nesta quarta-feira, alegando ser necessário “garantir a paridade de armas no procedimento investigativo”.
Reunião Ministerial
Entre as evidências utilizadas para fundamentar a investigação está a gravação de uma reunião ocorrida em julho de 2022, envolvendo Bolsonaro, ministros e militares, quando ele ainda ocupava a presidência.
Conforme a Polícia Federal, o então presidente da República teria exigido que seus ministros, em um desvio total de suas funções oficiais, promovessem e disseminassem, em todas as suas áreas de atuação, desinformações e notícias fraudulentas sobre a integridade do sistema de votação, utilizando a estrutura do Estado brasileiro para fins ilícitos e contrários ao interesse público.
De acordo com o relatório da Polícia Federal, durante a reunião gravada, o então ministro chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno, mencionou ter conversado com o diretor-adjunto da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) sobre a infiltração de agentes nas campanhas eleitorais, porém alertou para o risco de identificação dos agentes infiltrados.
Nesse momento, Bolsonaro interrompeu a fala do ministro, possivelmente percebendo o perigo de expor as ações dos servidores da Abin, segundo a PF, e ordenou que ele não prosseguisse com sua observação, sugerindo que discutissem posteriormente “em particular” sobre as atividades da Abin.
O então ministro do GSI afirmou com firmeza que ações deveriam ser tomadas contra certas instituições e pessoas, e que uma “virada de mesa” deveria acontecer antes das eleições.
“Então, o que tiver que ser feito tem que ser feito antes das eleições. Se tiver que dar soco na mesa, é antes das eleições. Se tiver que virar a mesa, é antes das eleições. Depois das eleições, será muito difícil que tenhamos alguma nova perspectiva”, afirma Heleno.
Em outro momento da reunião, Bolsonaro diz ter “o plano B, tem que botar em prática agora”.
“Só pra gente prestar atenção. […] A fotografia que pintar no dia 2 de outubro acabou, porra! Quer mais claro do que isso? Nós estamos fazendo a coisa certa, mas o plano B tem que botar em prática agora”, diz Bolsonaro na ocasião.