
A presença da influenciadora digital Virgínia Fonseca na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) das Bets impulsionou uma discussão que, há muito, deveria ganhar prioridade no Congresso Nacional. Enquanto parte do debate político se concentra em pautas ideológicas e projetos como a anistia, os graves problemas de endividamento e de saúde mental relacionados ao crescimento descontrolado das apostas seguem à margem dos holofotes da mídia e da política.
Em meio a situações constrangedoras que vimos no depoimento, a senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS) tentou convencer Virgínia a usar seu enorme alcance nas redes sociais para combater essa prática nociva. A resposta da influenciadora — de que iria refletir sobre o pedido, mas que sua atuação está dentro da legalidade e que o problema deve ser resolvido pelo Legislativo — pode soar insensível, mas traz à tona uma verdade incômoda.
O papel do Legislativo é justamente estabelecer os limites dentro dos quais se constrói a cidadania. E esse papel vai muito além da função educativa que a senadora, sensivelmente, tentou exercer naquele momento. A dimensão que o problema das apostas atingiu no Brasil tem, sem dúvidas, a contribuição da lentidão e omissão do próprio Congresso na regulação e acompanhamento dessa questão. É desconfortável ouvir uma cobrança dessas de alguém que lucra com a divulgação de plataformas que conduzem milhares de brasileiros a uma situação preocupante, mas a crítica tem fundamento.
Um estudo divulgado no ano passado pela Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC) revelou que, entre os apostadores, 64% admitem usar parte da renda principal nas apostas; 63% afirmam ter comprometido parte da renda com jogos online; 23% deixaram de comprar roupas, 19% reduziram gastos com supermercado, 14% com produtos de higiene e beleza, e 11% com cuidados com a saúde e medicamentos.
O Congresso Nacional precisa, com urgência, aproveitar o “hype” do depoimento de Virgínia para se engajar de fato em pautas como essa. A regulamentação ou até mesmo a proibição das apostas é uma questão social e de saúde pública.