O fenômeno da “adultização” de crianças e adolescentes nas redes sociais reacende debates sobre os limites legais e a proteção integral prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Para o advogado criminalista Gustavo Botto, mesmo sem nudez explícita, a produção ou divulgação de imagens com conotação sexual envolvendo menores pode configurar crimes previstos tanto no ECA quanto no Código Penal, como o favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual de vulnerável.
Segundo Botto, a responsabilização pode atingir não apenas quem produz ou publica o conteúdo, mas também quem incentiva ou facilita sua produção, respondendo como coautor ou partícipe, desde que haja prova de envolvimento consciente e ativo. “A mera presença ou proximidade com os envolvidos não é suficiente para caracterizar participação criminal. É preciso comprovar a intenção e o ato concreto”, explica.
O especialista destaca que, para menores de 14 anos, qualquer ato sexual configura estupro de vulnerável, independentemente de consentimento. Já adolescentes entre 14 e 18 anos permanecem sob proteção legal especial, e condutas de exploração sexual continuam sendo crimes graves. No entanto, Botto alerta para a necessidade de diferenciar conteúdos sugestivos de casos efetivos de exploração sexual.
No campo conceitual, “adultização” é um termo sociológico, relacionado à imposição de comportamentos, roupas e atitudes adultas a crianças e adolescentes. Já a exploração sexual é prevista em lei e envolve vantagem econômica ou qualquer forma de exploração da sexualidade. Quando a “adultização” é associada a conotação sexual e exposição pública, ela pode configurar crime, especialmente se houver intuito de lucro ou exposição indevida.
No ambiente digital, plataformas têm obrigação legal de remover conteúdos com indícios de exploração sexual e cooperar com investigações, conforme o Marco Civil da Internet e o ECA. A retirada das redes sociais de menores por decisão judicial pode ser considerada medida protetiva para evitar novas exposições, desde que proporcional e sem caráter punitivo.
Empresas e influenciadores também podem ser responsabilizados se comprovado que financiaram ou lucraram com conteúdos ilícitos. O Ministério Público do Trabalho, por sua vez, pode intervir quando há suspeita de trabalho infantil artístico ou publicitário irregular, inclusive na produção de conteúdo online.
Sobre provas, Botto ressalta a importância da preservação de arquivos originais e metadados para garantir validade jurídica. “Provas digitais precisam respeitar a cadeia de custódia para serem aceitas. Crimes dessa natureza são de ação penal pública incondicionada, ou seja, o processo continua mesmo sem denúncia formal da vítima”, afirma.
Na prevenção, a lei exige autorização judicial para participação de menores em trabalhos artísticos ou publicitários, e a supervisão constante das famílias sobre o conteúdo publicado. Pais ou responsáveis que autorizarem ou incentivarem exposição sexualizada podem responder criminalmente, inclusive com a perda do poder familiar em casos graves.
Por fim, Botto defende mudanças legislativas para tipificar novas formas de exploração digital, acelerar a remoção de conteúdo ilícito e responsabilizar patrocinadores e plataformas omissas. “As leis precisam ser claras, para proteger menores sem criminalizar manifestações legítimas”, conclui.