
A política brasileira, em tempos de extremismo e polarização, tem acumulado episódios de miopia diante dos reais problemas que precisam ser enfrentados. Recentemente, embalado pela presença da influenciadora Virgínia Fonseca, o debate sobre apostas ganhou destaque na CPI das Bets, uma temática que, como apontamos aqui na coluna, deveria ocupar lugar fixo na ordem do dia. Ainda assim, o Congresso desperdiçou o “hype” e o assunto rapidamente voltou ao esquecimento. À época, ressaltamos como essa discussão era mais urgente e não ganhava tanto destaque pela ocupação política e midiática com a proposta de anistia aos envolvidos no 8 de janeiro.
Não demorou muito para essa mesma pauta ser realimentada, afastando tantas outras questões importantes do foco dos debates nacionais. Desta vez, a questão ganhou contornos internacionais com as sanções anunciadas pelo ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. A postura do líder norte-americano não surpreende quem acompanha seu novo mandato, mas traz para a nossa mesa um grande novo problema a ser sanado, dificultado pela neblina carregada da ideologia na discussão política.
Chega a ser angustiante ouvir “patriotas” ou quaisquer outros brasileiros defenderem ações como a tomada por Trump, mas a dismorfia da política brasileira não cansa de nos surpreender. Mesmo na Paraíba, onde o impacto direto das sanções não está entre os maiores, o tom adotado no debate público (basta ligar o rádio local) parece mais uma disputa de torcidas organizadas, com camisas vestidas a qualquer custo. E ai de quem, sendo do campo conservador, ousa colocar a bola no chão e tratar o assunto com a seriedade que ele exige, como tem feito, por exemplo, o governador Tarcísio lá em São Paulo.
Diferente da Paraíba, que exportou 20 milhões de dólares para os Estados Unidos no primeiro semestre deste ano, ocupando a 23ª posição nacional, São Paulo lidera o ranking com 6,39 bilhões de dólares em exportação. Os dados são do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, divulgados pela Folha de S.Paulo. A postura do governador, divergente da de seu líder político Jair Bolsonaro, pode representar apenas um ato de sobrevivência administrativa e política, mas mostra que o peso da realidade pode se sobrepor aos arroubos ideológicos.
Até se resolver, mais uma vez o Brasil vai pagar caro por transformar tudo em uma guerra ideológica.